Demorei para postar por uma série
de motivos: (finalmente) tirei uns dias de férias e fui viajar com mamãe,
depois de muito tempo só programando, emendei pós com cursinho e trabalho, etc.
Aí, a minha leitura descompromissada fica totalmente prejudicada e, por isso,
acabo focando no Desafio Literário (e se é para ser desafio, não vou pegar
água-com-açúcar, né?) Mas, vamos lá!
Um dos expoentes do chamado
realismo mágico, onde a realidade e o
mundo onírico se misturam, de forma não delimitada, Gabriel Garcia Marques cria
outra grande obra, o “Outono do Patriarca”.
Mais conhecido pelo seu “Cem anos
de solidão” (aliás, ótimo e recomendadíssimo), é cult, bacana e bonito dizer
que gosta-se de Garcia Marques. Mas não se engane, não são livros fáceis.
No caso d’O Outono do Patriarca,
outros itens aumentam a complexidade da leitura: não está delimitada a
diferença entre a realidade e o imaginado; a construção do livro se dá em
parágrafos extensos, com pouca pontuação (praticamente pontos finais e
virgulas), o que torna o texto maciço e a não diferenciação entre as vozes de
seus personagens (às vezes, quem conta a história é o ditador, outras, o
narrador, e em outras, testemunhas dos fatos).
Portanto, não é o livro para se
ler em um dia. Ao mesmo tempo, sua estrutura, de parágrafos longos, não permite
que você pare de ler o livro em um ponto qualquer. É do tipo de livro egoísta e
ciumento; exige que você tenha dedicação a ele.
Dito isso, vamos à história (ufa,
né?): Num país sem nome, um ditador também sem seu nome revelado governa de
forma tirana. Somos apresentados à um patriarca, que não se sabe como chegou ao
poder, mas que está lá a tanto tempo que ninguém se atreve a contar. Refém da
imagem que criou, ‘escraviza’ seu povo e seus empregados, usando o poder de
forma irrestrita, canonizando a própria mãe, criando feriados quando bem
entende, dando condecorações quando acredita ser conveniente, abusa das
mulheres sem se constranger. É um semideus nesse país desconhecido.
Ao mesmo tempo, vítima do poder,
modifica os fatos ocorridos para que se beneficie deles, vive preso às
premonições que acredita ter e aos temores que ele próprio alimenta: dorme
trancafiado num quarto cujas chaves somente ele possui e sofre com uma hérnia
enorme no testículo, obrigando-o a dormir em uma única posição. Alimenta
ilusões, reforçando-as com o uso de um sósia e é obrigado a ver que não é tão
idolatrado, ao forjar sua morte.
Uma passagem curiosa é a venda do
mar que circunda o país, para o pagamento de uma dívida. Bizarro!
Percebe-se, portanto, que Garcia
Marques inspira-se em regimes totalitários reais e, sabiamente, ao não nominar
país e ditador, torna o tema familiar a todos nós, especialmente os que vivem
na América Latina, a reconhecer o teatro e atrocidades que são cometidas num
regime autoritário (o patriarca do título chega a mandar assar um de seus
ministros, para se ter ideia). É uma crítica ao colonialismo, à ditadura, ao
abuso do poder e sim, ao povo mau informado que acaba ajudando a perpetuar uma
situação absurda.
Leitura boa, densa e crítica.
Tire um tempinho em sua agenda para dedicar-se ao livro!